Investimento em pesquisa e inovação para salvar Piracanjuba

1 de dezembro de 2022

No foco da imagem está um profissional da CTG Brasil segurando um peixe. Ao fundo, outros profissionais estão em um tanque segurando uma rede com outros peixes

CTG Brasil aposta em pesquisa e inovação para salvar Piracanjuba, peixe ameaçado de extinção.

A Piracanjuba é um peixe brasileiríssimo, presente nas águas da bacia do Rio Paraná há séculos, antes mesmo da chegada dos colonizadores portugueses. Seu nome vem do tupi, e significa “peixe da cabeça amarela”. Há muito a espécie serve como fonte de alimentação a comunidades do interior do sudeste e sul do Brasil, pois é um animal de bom porte, com fêmeas podendo chegar a 10 kg e uma média de 80 centímetros de comprimento.

 

Segundo o IBAMA, a Piracanjuba é hoje uma espécie ameaçada de extinção. O perigo é acentuado por uma situação ainda não esclarecida pela ciência: a maioria absoluta dos peixes da espécie nasce macho (cerca de 90% da população que hoje habita as águas nacionais). O perigo é acentuado por uma situação ainda não esclarecida pela ciência: a maioria absoluta dos peixes da espécie nasce macho (cerca de 90% da população que hoje habita as águas nacionais).

 

Pensando nestes dois desafios para a preservação da espécie, a CTG Brasil vem desenvolvendo pesquisas com a Piracanjuba para aumentar a reprodução do peixe e equilibrar a proporção entre indivíduos machos e fêmeas. Em parceria com pesquisadores do Cepta (Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Aquática Continental), um órgão ligado ao ICMBio e ao Ministério do Meio Ambiente, descobertas promissoras vêm sendo feitas.

 

Barriga de aluguel

 

Técnicas japonesas foram adaptadas à realidade brasileira e hoje os times da CTG Brasil e do Cepta coordenam um sistema de reprodução que pode mudar completamente o cenário da Piracanjuba. A “propagação mediada”, nome científico do método, funciona como uma barriga de aluguel: lambaris, que são peixes dóceis e de fácil adaptação aos laboratórios, são tornados estéreis em laboratório, recebem células-tronco reprodutivas de Piracanjuba e passam a gerar alevinos (como são chamados os peixinhos recém-nascidos) desta espécie.

 

Imagem do peixe Piracanjuba.

 

“A vantagem nisso é que podemos usar lambaris fêmeas e machos, 50% a 50%. A Piracanjuba se reproduz uma vez ao ano, o lambari três vezes”, detalha Norberto Vianna, biólogo e especialista em meio ambiente da CTG Brasil.

 

Com investimento de R$ 7 milhões para quatro anos de trabalho, o método revoluciona o manejo da Piracanjuba, pois expõe menos o peixe ameaçado ao estresse do laboratório e, tendo uma taxa de sucesso alta, pode acelerar muito o repovoamento dos rios. As equipes da CTG Brasil já concluíram a etapa de transplante genético para os lambaris e esperam uma primeira reprodução, resultando em alevinos de Piracanjuba, já em 2023.

 

Programa faz repovoamento de sete espécies de peixe

 

Ao todo, o programa de repovoamento da CTG Brasil nos rios Paraná e Paranapanema coloca cerca de 3,6 milhões de peixes ao ano nos reservatórios de dez usinas hidrelétricas. O enriquecimento da fauna traz benefícios diretos às populações de pessoas que pescam nas represas, assim como impacto ambiental positivo.

 

“Ecologicamente, a Piracanjuba é um grande dispersor de sementes. Ela come frutos que caem na água na primavera e ajuda a compor a mata ciliar dos rios. É uma das únicas formas de disseminação de sementes que vai do baixo rio ao alto, porque a fruta sempre vai para baixo, e o peixe sobe a correnteza”, explica George Yasui, pesquisador da FMVZ/USP e um dos líderes da pesquisa do Cepta em conjunto com a CTG Brasil.

 

 

 

São sete espécies reproduzidas na estação de piscicultura em Salto Grande (SP): pacu, curimbatá, piapara, Piracanjuba, dourado, lambari e a piau-três-pintas. “Agora nós estamos montando um banco de matrizes de outras três espécies muito importantes que precisam de novas populações: pintado, jurupoca e jaú”, conta Vianna. No ciclo 2022/2023, os pesquisadores farão a primeira tentativa de reprodução em cativeiro destas novas espécies.

 

Desequilíbrio populacional é alvo de pesquisa

 

Descobrir a razão do predomínio de machos é outro braço da pesquisa da CTG Brasil sobre a Piracanjuba. Equilibrar a população deste peixe nos rios seria um fator de impulso natural a uma maior reprodução do animal. O fenômeno atinge mesmo os exemplares em cativeiro: tanto na natureza quanto em laboratório, os nascimentos são cerca de 90% de indivíduos machos.

 

Neste ponto, a parceria com especialistas do Cepta traz novamente inovações: o projeto vem fazendo a chamada “reprodução in loco”: exemplares de Piracanjuba nativas são capturados, porém sem serem retirados dos rios. Acondicionados em caixas d’água de 1000 litros e piscinas plásticas de tamanho similar, na beira dos rios os animais são estimulados com hormônios a liberar óvulos e espermatozoides, e após obtenção das larvas de Piracanjuba, as mesmas são colhidas e levadas ao laboratório para continuidade das pesquisas e formação de reprodutores com DNA nativo.

 

“Usar para repovoamento uma espécie ameaçada, estabelecendo um banco genético, e ter esta preocupação com a proporção sexual é algo muito inovador, eu respeito muito a CTG Brasil por estas atitudes, que são fundamentais.”

George Yasui, pesquisador do Cepta/ICMBio

 

“As larvinhas que nós obtivemos na beira do rio já crescem domesticadas, condicionadas a tanques e alimentos artificiais. Ela vai crescer num ambiente de piscicultura e facilmente reproduzir quando se tornar adulto. Já é considerado um sucesso – temos peixinhos com a genética selvagem desenvolvendo super bem. Os peixes vão se reproduzir em dois a três anos e será também um grande salto na capacidade de repopulação da CTG Brasil em suas barragens”, afirma Yasui.

 

Os pesquisadores devem acompanhar o desenvolvimento dos peixes e testar hipóteses para descobrir o que está influenciando o desequilíbrio de gênero da espécie. As temperaturas mais altas são uma suspeita, porém ainda não confirmada – a resposta para este mistério só a ciência poderá trazer com o desenvolvimento dos estudos.

 

Vianna ressalta o incentivo do projeto à pesquisa, na forma de verbas e bolsas de estudo, e vê o trabalho com otimismo. “É um projeto maravilhoso, onde eu tenho grandes esperanças de resolver essa questão do repovoamento com a Piracanjuba e descobrir o que causa o desequilíbrio populacional.”